InícioTecnologia em ProdutosExplorando a pré-fabricação: desafios e possibilidades com o Parkside Carvoeira

Explorando a pré-fabricação: desafios e possibilidades com o Parkside Carvoeira

Toda inovação traz consigo fricções, disrupções e, acima de tudo, aprendizados. Na construção civil — um setor historicamente resistente a mudanças — novos sistemas construtivos costumam ser recebidos com certo estranhamento, exigindo uma análise cuidadosa dos desafios que surgem. O sistema wood frame, amplamente adotado em países como Estados Unidos, Japão e Alemanha, nunca se popularizou no Brasil, devido a fatores que mantêm o setor intensivo em mão de obra e fortemente vinculado aos métodos convencionais de alvenaria e concreto.

No entanto, com a diminuição da oferta de mão de obra e novas demandas por eficiência e sustentabilidade, o setor da construção civil tem, gradualmente, explorado alternativas inovadoras. Nesse contexto, o edifício Parkside Carvoeira, em Florianópolis, destaca-se como um marco de inovação, sendo o edifício em wood frame mais alto da América Latina. Desenvolvido em parceria entre a Parkside, o escritório Desterro Arquitetos e a construtora local Tecverde, o projeto pioneiro adota o sistema como uma solução sustentável e eficiente para atender às necessidades da construção contemporânea no país.

A implementação do sistema no Parkside Carvoeira exigiu um planejamento minucioso e uma preparação cuidadosa da equipe envolvida. Como observou Felipe Cemin Finger, arquiteto da Desterro Arquitetos, a familiaridade preliminar que a equipe possuía de sistemas de construção inovadores foi essencial para adaptar o projeto ao contexto brasileiro e superar as complexidades do sistema industrializado.

Por tratar-se de um sistema construtivo diferente do tradicional, exigiu da nossa equipe muita pesquisa e estudo. O domínio das possibilidades e limitações do sistema permitiu projetarmos uma edificação que conversa com o seu local de inserção, integrando-se à cidade e atendendo as demandas programáticas e técnicas. – Felipe Cemin Finger

O uso do sistema modular e industrializado do wood frame proporcionou uma grande economia de tempo e recursos, especialmente com a pré-fabricação dos 290 painéis. “Todos os painéis, com as esquadrias e instalações elétricas e hidráulicas já embutidas, foram fabricados em apenas 15 dias e montados em canteiro em 9 dias,” destacou Alexandre Muller, da Parkside. Em comparação aos métodos convencionais, que levariam em média 18 meses, o Parkside foi concluído em 11 meses, representando uma abordagem mais enxuta e ambientalmente responsável.

Esse método construtivo também reduziu em 90% os resíduos sólidos e economizou 85% da água. A abordagem sustentável foi reconhecida, e o projeto conquistou o título de segundo edifício ESG do Brasil no GRI Awards 2023. Muller complementa: “Um projeto industrializado reduz a quantidade de funcionários necessários para a construção e aumenta a segurança no canteiro, visto que o método reduz a exposição de trabalhadores em altura”.

Um dos principais desafios técnicos do projeto foi a conexão entre a estrutura de concreto do embasamento e o wood frame. Segundo Alexandre Muller, da Parkside, esse processo cuidadoso de adaptação e planejamento resultou em uma edificação robusta, preparada para suportar as demandas estruturais e climáticas do local. Outro desafio foi acomodar o guindaste e as carretas que transportaram os painéis da cidade de Araucária, no Paraná (a cerca de 300 km) ao canteiro de 510 m², sem impactar o trânsito local. Para isso, um layout específico foi desenhado e um guindaste especializado foi contratado para içar e montar painéis de até 1 tonelada. Isso exigiu uma laje de transição extremamente densa para fazer o travamento de toda a estrutura de madeira e resistir às cargas de vento.

Desde a escolha do terreno até a orientação solar, o Parkside Carvoeira foi pensado para maximizar o conforto e a eficiência energética dos seus ocupantes. “Os ambientes de maior permanência e as unidades são dispostas na melhor orientação solar para a localidade, enquanto ambientes transitórios ficam para a fachada de orientação menos favorável,” explicam os arquitetos da Desterro, destacando o uso da luz natural e da ventilação cruzada para reduzir a dependência de sistemas mecânicos e otimizar o conforto térmico. As floreiras suspensas, desenvolvidas para permitir o crescimento de vegetação trepadeira, somam ao design sustentável, oferecendo sombreamento natural para as aberturas e contribuindo para o bem-estar dos residentes.

Para lidar com as particularidades do sistema industrializado e garantir um alinhamento coeso ao longo do processo, a colaboração entre a equipe de arquitetura e a construtora foi fundamental. A metodologia BIM (Modelagem da Informação da Construção) foi essencial para tal, permitindo antecipar incompatibilidades e aprimorar a coordenação entre disciplinas.

Um projeto industrializado demanda o uso de sistema e ferramentas de projeto que possibilitem a incorporação de informações em um modelo virtual o mais próximo da realidade possível.

Como conclui Felipe Finger, “o Parkside Carvoeira é um exemplo de como sistemas construtivos industrializados podem ser visualmente atraentes e altamente integrados ao contexto local e demonstra que a construção industrializada não precisa ser monótona ou rígida, mas pode resultar em um design dinâmico e sustentável.”

O uso do wood frame possibilitou o sequestro de 144 toneladas de CO2, reforçando o compromisso do projeto com a sustentabilidade. A seleção de acabamentos externos priorizou materiais duráveis, como texturas para a fachada e telhas metálicas nos volumes verticais, enquanto o interior foi pensado para conforto e desempenho, com pisos laminados, paredes de gesso liso e revestimento cerâmico nas áreas molhadas.

Embora essa tecnologia esteja consolidada em diversos mercados, sua implementação no Brasil deixa um legado significativo. O sistema wood frame, que utiliza estruturas leves de madeira e componentes pré-fabricados, não só reduz o tempo de construção, como também minimiza o desperdício de materiais, resultando em um processo mais eficiente e sustentável. Com um desempenho térmico e acústico superior, esses métodos construtivos industrializados podem atender às crescentes demandas por eficiência energética e conforto habitacional.

Além disso, a utilização de madeira como material principal contribui para a redução da pegada de carbono, promovendo uma abordagem mais ecológica em um setor historicamente dependente de materiais como concreto e aço. A experiência mostra que métodos construtivos industrializados e sustentáveis podem oferecer respostas integradas aos desafios da construção moderna, especialmente em países em desenvolvimento, onde a necessidade de habitação acessível e sustentável é cada vez mais urgente. Assim, o edifício Parkside Carvoeira não apenas representa um avanço técnico, mas também estabelece um caminho viável para um futuro mais sustentável na construção civil brasileira.

Escrito por: Eduardo Souza para o site archdaily

Foto: Lio Simas

Fonte: archdaily